Principal papel da meteorologia é proteger vidas, diz CEO da Climatempo para América Latina

19/06/2023
Fonte: Um Só Planeta / Foto: Divulgação

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Previsões meteorológicas contam hoje com uma impressionante infraestrutura global: rede de satélites, sondas, estações meteorológicas, modelos matemáticos cada vez mais detalhados, análises por inteligência artificial. Ainda assim, estamos numa corrida difícil contra as mudanças climáticas – que exigem mais e melhores dados para ser bem compreendidas -- e seus efeitos trágicos. Além de avisar para potenciais catástrofes, é preciso saber reagir diante dos alertas.

Patricia Diehl Madeira entende bem o desafio. A executiva e meteoróloga é, desde abril, CEO da Climatempo, principal empresa privada de consultoria meteorológica do Brasil. Desde 2019, a empresa faz parte do grupo norueguês StormGeo, um dos maiores do mundo no setor. “Nosso papel como empresa é manter as pessoas seguras”, destaca a CEO.

Esse trabalho vai se tornando mais complicado diante da crise climática e de eventos extremos cada vez mais frequentes. Patricia destaca tendências evidentes e preocupantes no Brasil -- a savanização da Amazônia, o atraso nas ondas de umidade do Norte para o Sudeste, o aumento da área de Cerrado no centro-oeste, o Nordeste cada vez mais seco. “Precisamos ter foco especial na nossa Floresta Amazônica. Se desestabilizarmos a floresta e ela chegar ao ponto de não retorno, isso vai afetar todo o sistema meteorológico. Pelo seu tamanho, posição e pelo que ela provê, há efeitos no país e no mundo inteiro”, diz a executiva.

Dentro de uma estratégia de visão global de negócio, Patrícia assumiu em março de 2023 para expandir a Climatempo na América Latina. Essa mudança também trouxe mais tecnologia e novos serviços especializados para a companhia, para atender a mais de 20 setores da economia. A empresa segue suas políticas de redução de carbono e atualmente faz a compensação em parceria com a brasileira Moss. Para o futuro, a ideia é lançar uma calculadora de pegada ecológica.

Em entrevista a Um Só Planeta, Patrícia fala sobre o avanço das tecnologias de previsão do tempo, a virada de chave frente aos eventos climáticos extremos causados pelas mudanças climáticas e o papel da metereologia na adaptação e prevenção de tragédias. Confira:

 

Neste momento de crise climática, qual é o papel da meteorologia na vida das pessoas?

Patricia – A primeira função é a segurança. Preciso saber se vai chover forte, pois nesse caso não vou me deslocar para uma região perigosa, por exemplo. Em lugares muito frios ou em situações de muito calor, você pode morrer. Diferente do que a maioria das pessoas pensa, a principal causa de morte de pessoas ligadas à meteorologia não é por tornado, furacão, geada, e sim por ondas de calor. O segundo papel é o planejamento.

 

Como vocês percebem que estão diante de um evento causado por mudanças climáticas? Teve algum momento de virada de chave em relação a essa percepção nas previsões?

Patricia – Vamos falar primeiro do marco: com todos os satélites do mundo inteiro, já é possível perceber pelos dados que a temperatura está subindo. Não há como não acreditar mais no aquecimento global. Temos provas que o planeta está esquentando, é irrefutável. Se você medir uns 30 anos, você vê que está aquecendo.

Aí vêm as mudanças climáticas. Quando você tem os dados de determinados lugares e vê que a temperatura e as condições estão diferentes, é uma mudança do clima: está mais quente, chove mais ou menos. Por exemplo, a Amazônia tem um ciclo anual, que chamamos de monções amazônicas, e esse processo de umidade vindo do Norte para o Sudeste do Brasil vem ocorrendo cada vez mais tarde.

Quando falamos de eventos extremos, isso também já é provado – posso estar falando de seca, excesso de chuva, calor ou frio. Muita gente não entende, mas as mudanças climáticas são associadas aos extremos. Se você quer saber se está diante de um evento do clima ou mudança climática, você pega alguns modelos e simula cenários sem o aumento da temperatura. Se mesmo assim o evento acontecer, então não é associado à mudança climática. Sempre tivemos esses eventos, mas eles estão mais intensos. Foram comprovadamente causados pelas mudanças climáticas a onda de calor na Europa no ano passado, as chuvas em Petrópolis (RJ) e em São Sebastião (SP). As secas no Sul não são comprovadas, por causa do fenômeno do Lã Nina.

 

Como usar a previsão do tempo como aliada na prevenção e adaptação frente a esses eventos climáticos extremos? A Climatempo trabalha junto ao poder público?

Patricia – Temos um site com 15 milhões de usuários mensais, por lá nós fazemos esses avisos. Só não podemos chamar de “alerta”, pois esse é o papel da Defesa Civil e do governo. Também temos parceria com algumas defesas civis dos estados e secretarias, trabalhando dentro de alguns órgãos em cada estado para fazer os alertas para as empresas. Por meio da Globo também conseguimos fazer esses avisos. Temos uma infinidade de canais.

Fazemos isso com antecedência. Com cinco dias, já conseguimos avisar que vai ter uma chuva muito forte, por exemplo. São Sebastião teve os primeiros avisos saindo numa terça-feira, na quinta-feira a Defesa Civil soltou alerta, a tragédia aconteceu no sábado (na noite de 18 para 19 de fevereiro). Infelizmente, aqui no Brasil ainda não somos eficientes na comunicação de alertas. É complicado, as pessoas mais afetadas, as mais vulneráveis, estão em áreas de risco. Você avisa, mas precisa também ter um plano muito bem estruturado para que as pessoas possam ser removidas.

Adaptação também é um fator importante, mas é um desafio. Você vê os morros e pensa: para onde realocar todas as pessoas? É muito difícil. No momento que eventos climáticos extremos ficam cada vez mais frequentes, isso precisa ser prioridade número um nas questões políticas. Isso pode ser melhorado.

 

O que você vê de mais impressionante e mais promissor na evolução das tecnologias de previsão do tempo?

Patricia – A tecnologia continua mudando muito rápido. Temos novos satélites lançados desde 2017 e há mais qualidade dos dados. A evolução faz com que a meteorologia esteja cada vez mais precisa. Os dados meteorológicos avançaram, mas o Brasil ainda é meio fraquinho nessa questão das estações (de captura de dados). Deveríamos ter muito mais - no Norte e Nordeste, temos bem poucas. O Oceano Atlântico ainda tem pouquíssimo também. De qualquer forma, melhorou muito, pela capacidade de computação e pelos modelos numéricos.

As tecnologias de inteligência artificial e machine learning, junto à facilidade de processamento, mudaram completamente em comparação com 15 anos atrás, inclusive em um cenário de mudanças climáticas. Há 30 anos, quando comecei a trabalhar, a gente só tinha uma modelagem. Era muito pouquinho e não confiávamos muito nela. O avanço da computação e da tecnologia permitiram que a gente fizesse cálculos cada vez mais complexos, em menos tempo. Hoje temos modelos muito mais precisos do que no passado. E, atualmente, para fazermos a melhor previsão no Brasil, temos 280 modelos, que a gente consegue avaliar por meio de machine learning e inteligência artificial.


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